AS VITRINES
Eu te vejo sair por aí
Te avisei que a cidade um vão
Dá tua mão
Olha pra mim
Não faz assim
Não vai lá, não
Os letreiros a te colorir
Embaraçam a minha visão
Eu te vi suspirar de aflição
E sair da sessão, frouxa de rir.
Já te vejo brincando, gostando de ser
Tua sombra a se multiplicar
Nos teus olhos também posso ver
As vitrines te vendo passar
Na galeria
Cada clarão
É como um dia depois de outro dia
Abrindo um salão
Passas em exposição
Passas sem ver teu vigia
Catando a poesia
Que entornas no chão
1. ABRINDO UM SALÃO:
A canção As Vitrines tem letra e música de Chico Buarque de Hollanda, lançada em 1981 quando o vinil ainda era chamado de LP. Era integrante do disco Almanaque, o 26º sua carreira, cujo encarte, apresentava uma bela produção gráfica que, além das letras das canções, continha uma série de imagens, desenhos e grafismos, como se fosse um verdadeiro almanaque.
A canção As Vitrines era um presente ao leitor, que ao invés de uma, ganhava duas letras, disposta no avesso da primeira, e, subitamente começava a se deformar, como num espelho distorcido. As palavras eram montadas de forma normal, de cabeça para baixo e de trás para frente, dando a impressão de serem vistas através dos vidros das vitrines. E o resultado geral da apresentação desse poema sob várias formas é a configuração de um retângulo, simbolizando a loja, a vitrine ou os múltiplos pontos de vista do personagem observador, ou ainda, a idéia da própria poesia que estaria sendo “entornada” no chão, desfigurando-se, caindo para baixo, de lado, ou em várias direções.